Capítulo II - Apelação
- É... é... é que... – gagueja o cara enquanto os outros nove rostos ficam olhando pra ele, estapafurdiados.
- Dava pra parar de gaguejar, meu avião ta saindo daqui a alguns minutos. – fala ele, já impaciente.
- Não quer ficar aqui comigo ao invés de ir embora? – diz ele com a voz tremendo e baixa, como se houvesse um abismo entre os dois. Na verdade havia doze pessoas, pois três argentinos se interessaram pela cena e resolveram parar para assistir, embora não entendessem nada, afinal, argentinos não entendem português, embora brasileiros consigam entender espanhol.
Depois de ouvir isso o cara fica branco e a família, que até então não dizia nada, resolve se manifestar. Como assim, fica comigo? Que história é essa de não ir viajar mais? Ele até pode ficar no Brasil, mas se for pra ficar com ele, eles preferem que o filho vá pra Antártida.
- Eu acho que você deveria ir agora, meu filho – fala a mãe do cara, sempre compreensiva e sem se alterar. Pra ela tudo não passava de uma epopéia catatônica, um surto psicótico saído de algum filme do Spielberg. O resto concorda com ela, óbvio.
- Não dá pra pedir pra segurarem o avião uns dez minutinhos não? Eu passei 5 anos querendo resolver isso, e agora tenho só cinco minutos! – fala o cara, já segurando a mala na mão.
- Por favor, me escuta. Eu não queria dizer isso na frente de todo mundo, mas eu preciso de você. Sei que não nos falamos desde o dia em que terminamos, quer dizer, o dia em que eu terminei com você, porque fui eu quem terminou, e não você. Mas hoje tudo mudou. Depois que eu fiquei sabendo que você ia embora eu decidi que largaria qualquer coisa pra ficar com você. Só você pode me fazer um pouco mais feliz na minha mediocridade. Diz que fica, por mim, tenta lembrar dos bons momentos que tivemos juntos no meio daquele mar de decepção que eu sei que deixei. Por favor... – e uma lágrima escorre, bem de canto, pelo lado direito do nariz, contornando alguns sulcos que o tempo criou em meio ao rosto. (Putz, isso ta começando a parecer Tolkien).
O cara que já está atrasado para pegar o avião junta sua mala mais uma vez, olha pra todos o encarando perplexamente, dá meia volta e entra pelo portão de embarque, sem um tchau, adeus ou até logo.
(continua)